quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Divulgação: Arthur Fênix - Sobrevivendo ao Caos

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Sinopse: A vida como Arthur Fênix conheceu em seus 16 anos está prestes a mudar completamente. O rapaz não é nenhum grande guerreiro ou mesmo um herói, é apenas um garoto comum que acaba envolvido em um enorme problema: sua cidade foi invadida e devastada. Tudo graças a uma raça de seres desconhecida por ele, de aparência meio humana, meio animal. Após essa aparição inusitada e trágica, o rapaz também descobre que existem outros seres habitando a ilha onde mora, e suas diferenças e especificidades vão muito além da aparência física e ideais de vida. Mesmo em meio a muitas dificuldades, com a ajuda do grupo de amigos que fez durante sua caminhada, o rapaz, mero sobrevivente de todo aquele caos, inicia uma busca incessante por seus pais, que ele já nem sabe se estão vivos ou mortos.

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terça-feira, 24 de julho de 2018

Conto: Novo Começo (3/3)

* Sinopse do livro aqui!

5 anos antes do início do caos.



Cansada de tanta correria, Marlene sabia que ainda não podia ceder. Por mais que todo medo e tensão pairassem no ar, não havia precisado pedir duas vezes para que sua tripulação voltasse e ajudasse os companheiros em perigo. Ainda mais quando um desses companheiros era o principal candidato a liderança do grupo, depois da tragédia que acontecera a Abner.
Enquanto a maioria se organizara para ir atrás dos que ficaram para trás, outro grupo menor pegou um dos botes e foi até o navio levando Miguel com eles, onde deixariam tudo preparado para partirem com os outros assim que fosse possível.
Com praticamente o mesmo número de guerreiros que os tauros, o grupo chegou a clareira a tempo de ver tudo acontecer. Exaustos, James e Bryan lutavam ferozmente contra Zack. Golpes iam e vinham de um lado para o outro. Em algum momento, quando levou uma cotovelada que o fez rolar pelo chão, James se posicionou de joelhos e agarrou sua besta. Além da flecha que já engatava nela, lhe restava apenas mais uma em sua aljava. Enquanto isso, Bryan percebeu o que o irmão pretendia e, quando o momento surgiu, tentou dar um salto e se afastar do ser, no intuito de fazer James ter uma visão mais limpa do alvo, mas como se previsse seus movimentos Zack deu um passo a frente e o agarrou com uma das mãos, erguendo-o no ar enquanto a outra mão tinha uma espada apontada para o pescoço do rapaz. A pressão aplicada no pescoço de Bryan o fez largar sua espada.
- Jogue sua besta fora! – Ordenou o tauro, em sua voz gutural.
- Não... não faça isso... – Conseguiu granir Bryan, praticamente sem voz. Ele se agarrava a mão do tauro, tentando tomar folego, e chutava-o, mas nenhum de seus golpes parecia fazer efeito.
- PAREM TODOS! – Gritou Zack, ao ver que os reforços de Marlene a essa altura já estavam a pouquíssimos metros dele.
Receando que algo acontecesse a Bryan eles obedeceram, inclusive Miguel, hesitante, jogou sua besta aos pés de Zack, que chutou-a para longe. Não sabia se aquela era a melhor escolha, mas imaginou que não seria uma boa ideia enfurecer alguém que tinha uma espada apontada para o pescoço de seu irmão.
- Estão vendo?! Essa é a ordem natural das coisas, humanos obedecendo a nós! A força fazendo o poder! – Gritava Zack, desfilando na frente de seus homens ainda com Bryan em mãos.
Os tauros urraram conforme seu líder falava.
- DEIXE-O, ZACK! – Gritou James. Seu peito parecia que iria explodir. – OU EU O MATO AGORA MESMO!
A ameaça fez os tauros rirem.
- Estão vendo?! Veem como eles parecem ter se esquecido da nossa superioridade?! Veem como eles acham que podem nos dar ordens! – Conforme falava, os tauros passaram a urrar cada vez mais. – E sabe o que fazemos com gente assim?! Nem sequer sujamos nossas lâminas, NÓS APENAS OS ESMAGAMOS!
“Crack!”.
Um grito áspero surgiu de Bryan, e então sua voz se tornou esganiçada e seus chutes perderam a força até cessarem completamente. Miguel só conseguiu perceber que aquele era realmente o fim quando viu a cabeça de Bryan pender para o lado, imóvel, e antes do corpo ser largado ao chão os gritos de James já poderiam ser ouvidos até do outro lado do oceano.
Em choque, Marlene e os humanos apenas olhavam James em seu momento de fúria. Ao contrário do que acontecera quando presenciara o assassinato de Abner, ao invés de paralisar o homem buscando colocar toda sua energia para fora de seu corpo, tremendo, chorando, gritando e socando a grama.
Em algum momento aquela energia precisou ser canalizada para algum lugar. Ter um foco real, e foi quando Marlene passou a temer pela vida e até a própria sanidade do homem em um dia tão cruel como aquele. James se levantou e, mesmo sem sua besta, agarrou sua última flecha da aljava enquanto corria e pegava a espada caída de Bryan com a outra mão.
Seus movimentos se tornaram tão rápidos e potentes como se seu corpo houvesse sido possuído pela ira de mil guerreiros ensandecidos, e então, com exceção de Zack, que ainda tinha um sorriso malicioso estampado em sua cara de touro, os outros tauros já não riram mais, e ainda observavam a tudo com olhos arregalados.
Ainda assim, Zack era ainda mais forte do que poderiam imaginar. Enquanto se esquivava e defendia com a espada, também precisou usar a braçadeira de seu outro braço como uma espécie de escudo para conseguir dar conta dos golpes de James, que avançava sobre ele tanto com aquela flecha como com a espada. Mesmo sem atingir Zack, Marlene percebeu que o tauro agora suava, e seu sorriso malicioso desparecia de seu rosto animalesco.
Aparentemente os outros tauros também perceberam isso, e foi quando dois deles avançaram sobre James, que, como se lutasse contra crianças, percebeu a chegada dos dois e enfiou aquela flecha no pescoço de um deles enquanto se agachava para desviar do ataque do segundo, e ainda enfiava sua espada no abdômen do ser. Em seguida finalizou com um ataque em seu pescoço.
Seus inimigos mal conseguiam vê-lo, e quando seus olhos cheios de raiva se voltaram novamente sobre Zack, o encarando com certo temor, foi quando a confusão se iniciou. Tanto os humanos quanto os tauros decidiram que era a hora de intervir na batalha.
No meio da confusão de sangue e tinir de espadas, James recebeu uma pancada na lateral da cabeça antes que conseguisse chegar até Zack, que àquela altura já se misturava entre os seus para se afastar do local de guerra.
O golpe fizera James bambolear e sua visão se tornar turva, e toda aquela fúria que surgira nele a pouquíssimos segundos atrás parecia ter desaparecido junto com seu equilibro. Fazendo um esforço para conseguir se manter em pé e encarar o tauro que o atacara, tentou desferir um golpe no mesmo com sua espada, mas sua força já não era mais a mesma, e o golpe foi facilmente repelido, como se além de tudo James também houvesse se lembrado que batalhas com espada não eram sua especialidade.
Mas nem precisavam ser, pois um dos seus chamado Lobianco conseguiu chegar até ele e ajudá-lo. Com isso James conseguiu se resguardar e dar mais alguns passos para trás no intuito de encontrar uma melhor visão. Mesmo que ainda enxergasse um pouco embaçado, observou que atrás daquela cena de guerra Zack caminhava lentamente até o fim da clareira, perto da cachoeira. Em seus ombros estava Isaque, desacordado, e o tauro se virava para encarar James.
Seus olhos vermelhos transmitiram um pouco de medo e desprezo, mas acima de tudo diziam que a raiva não lhe abandonaria tão cedo.
Como se tentasse enganar a si próprio, Zack forçou um sorriso malicioso e fez um sinal com uma das mãos, indicando que James fosse até ele. Naquele momento foi como se, mesmo que muito longe da mesma intensidade de antes, aquela sensação de ira voltasse a tomar o corpo de James, e quando ele deu alguns passos contornando o cenário de luta e correndo em direção a Zack, que com Isaque em seu ombro já se metia floresta a dentro, o homem então sentiu um estalo em sua nuca, e sua visão se tornou escura e ele caiu no chão.
Atrás de James, Marlene fazia um sinal para que Lobianco viesse até ela e ajudasse a carregar James.
- Tive que fazer isso, não podemos correr o risco de perdê-lo.
Lobianco assentiu.
- Não posso ajudá-la, meus companheiros precisam de mim! – Disse ele, apontando para o cenário da batalha logo atrás dele.
- Não! Temos que ir embora imediatamente! Você me ajuda enquanto batemos em retirada.
Receoso, Lobianco assentiu, e então eles passaram a carregar James floresta a dentro, em direção ao navio, enquanto Marlene gritava ordens para que seus amigos se retirassem.
O tinir de espada e os gritos o seguiram por todo o caminho.

*

Enquanto embarcavam no bote com James, ainda desmaiado, Marlene e Lobianco puderam ver como a maioria de seus companheiros não conseguiu chegar até eles ou aos outros botes a tempo. Enquanto tentavam lutar e correr em retirada, muitos acabaram morrendo. Seja no caminho de volta até a praia, ou mesmo enquanto embarcavam nos botes.
No fim das contas somente outros dois botes com um punhado de pessoas conseguiu voltar de lá. Marlene olhava aquilo tudo com lágrimas nos olhos enquanto na praia os tauros riam e urravam em comemoração, fazendo brincadeiras nojentas com os corpos dos seres humanos assassinados.
Era tanto o terror que a mulher teve que desviar os olhos. Sabia que era um erro ter levado um grupo de volta para tentar resgatar James e os outros, e pior ainda seria se deixasse James ir atrás de Zack ou tentassem resgatar Isaque. Ainda assim, não se perdoaria se desonrasse a memória de seu tio Abner e deixasse seu amado James morrer.
Abner, o homem que fora praticamente um pai para ela e, de certo modo para todo seu grupo também, agora estava morto. Simplesmente morto, e a única coisa que poderiam fazer para mantê-lo vivo era honrar sua memória e cumprir suas vontades, porém, depois da cena que vira, tinha certeza de que a vontade de Abner não poderia ser cumprida.
Depois de tudo que acontecera a James, ela sabia que ele dificilmente se recuperaria de todo aquele choque. James foi contaminado pelo ódio, e a agora já não mais poderia ser o líder que aquele grupo precisava. Além disso, ela sabia também que a liderança provavelmente não seria uma vontade do homem, isto é, caso realmente tenha sido sua vontade um dia.
Enquanto seu bote se aproximava do navio tudo que Marlene pensava era com que cara olharia para todos os outros sabendo que tantas mortes aconteceram e que muitas delas foram sua culpa. Como seria a vida quando voltassem para casa? Abner era o pilar de todos, e agora ela sentia como se tudo estivesse desmoronando junto com ele.
Abner, Bryan, Isaque e tantos outros. Tantos inocentes que permaneceriam para sempre em suas memórias.
Quando subiram até o navio, quase não conseguiu suportar todo aquele sentimento de tristeza e perda que preencheu o lugar. Ainda assim, todos aqueles olhos cheios de lágrima pousaram sobre ela e demonstraram confiança. Demonstraram uma vontade de viver e se reerguer. Algo embutido dentro deles que não podia ser contido ou mascarado e que se voltava para ela naquele instante.
E foi quando ela soube.
Agora todas as suas esperanças estavam sendo depositadas sobre ela, e depois de tudo, de todas as mortes que provocara e do modo como nem sequer conseguiria honrar a memória de seu tio, Marlene entendeu que estava em dívida com todas aquelas pessoas, e já não poderia mais decepcioná-las.
Querendo ou não, agora era seu momento de ser o pilar. Era o seu momento de ser o farol e guiar todos aqueles corpos vazios, despidos de orientação, de volta para casa.
Seu olhar decaiu sobre James e Miguel, deitados ao chão lado a lado, e seu coração se tornou ainda mais pesado, sentindo que também havia falhado com eles e com Isaque, as três maiores paixões de Abner. Sabia que quando acordassem os dois talvez se zangassem com ela, talvez até a odiassem para sempre, mas também sabia que se sentiria muito pior se eles não estivessem ali, assim como Isaque não estava.
Ergueu seu olhar sobre os outros, e entendeu que era o momento de guardar suas lagrimas e qualquer discurso motivacional fajuto. Hoje eles haviam perdido e nada mudaria isso, mas amanhã seria um novo dia, e ela não deixaria que aquele fosse o fim de sua história.
Aliás, não deixaria que aquele fosse o fim de mais ninguém.
- Içar velas! – Gritou ela, firmando os ombros e a voz. – Temos um longo caminho de volta para casa.
Aquele era o seu mundo, e nele mais nenhum tauro teria vez. Nem que precisasse caçá-los um a um.

FIM DA ULTIMA PARTE

Conto: Novo Começo (2/3)

* Sinopse do livro aqui!

5 anos antes do início do caos.



- Irmão. Irmão...
Miguel estava paralisado. Não ouvia nada ao seu redor.
- Irmão! – Chamou-o Isaque, dando um puxão mais forte no braço do outro.
Miguel então acordou de seu transe e olho o mais novo, que nada disse. Isaque tinha os olhos úmidos e a expressão assustada. Alternava seu olhar entre as árvores, por onde várias pessoas da Organização corriam e gritavam, e em seu irmão.
- Abner está...
- Abner está bem. James vai cuidar dele, não se preocupe – Disse Miguel, tentando confortar o irmão ou talvez até a si mesmo. Limpou os próprios olhos, onde as lágrimas ameaçavam escorrer.
Isaque assentiu, trêmulo.
- Você precisa voltar, Isaque. – Continuava ele, observando seus companheiros que evitavam correr pela clareira, aonde estariam expostos. Ao invés disso faziam o caminho de volta contornando o lugar pela floresta fechada.
- Você vem comigo, não vêm? – Perguntou o garoto com uma expressão perplexa de quem já sabia aquela resposta.
Miguel simplesmente o fitou no rosto. Não sabia como responder, mas antes que pudesse dizer qualquer coisa viu que, atrás deles, Marlene e agora Bryan tentavam tirar James dali, mas o homem, ainda atônito com o que vira, não fazia questão de se mover, mesmo que um grupo de três daqueles seres se aproximasse deles no intuito de atacá-los.
Bryan tomou a iniciativa e embainhou a espada, se pondo a frente dos outros. Porém, Miguel sabia que três enormes tauros seriam demais para ele dar conta sozinho, e Marlene hesitava, não sabendo se deveria ajudá-lo ou tentar tirar James dali.
Miguel se ajoelhou na frente do irmão e, mesmo com pressa, olhou profundamente em seus olhos.
- Isaque, eu preciso que corra. Não vai ser fácil nessa mata, mas basta que siga a trilha dos outros. Não é um caminho tão extenso, simplesmente corra até estar a salvo, eu sei que você consegue. Promete que vai fazer isso?
Trêmulo, o garoto tentou pedir que o irmão fosse com ele, mas seu medo era tanto que sua voz não saiu, e então ele assentiu. Miguel lhe deu um beijo na testa e olhou-o por mais um segundo, antes de voltar a falar.
- Agora vá. Vá!
Sem jeito, Isaque correu desengonçadamente, enquanto Miguel, sabendo que a vida de seu irmão e amigos dependia dele, embainhou sua espada e correu em direção aos tauros que chegavam. Suas mãos estavam tão tremulas que sua espada quase caiu, mas ele segurou-a com mais força, de modo que o nó de seus dedos ficassem esbranquiçados.
Enquanto isso Bryan se mostrava mais habilidoso do que aparentava ser nos treinamentos. Quando os tauros pareciam ter percebido que ele protegia James, avançaram em direção a ele, mas o rapaz conseguia contê-los através de golpes rápidos com sua espada.
Em certo momento, Miguel percebeu que a desvantagem entre os que lutavam se fizera valer, e enquanto Bryan desviava de um golpe de machado e tentava desarmar outro com um golpe, não conseguiria evitar um ataque do terceiro tauro, que levava a espada até a região de seu pescoço. Antes que isso acontecesse, Miguel se jogou a frente de Bryan, colocando toda sua força no movimento com sua espada, esperando que fosse o suficiente para parar o golpe do outro.
E de alguma forma foi. As espadas tilintaram e se afastaram, fazendo com que a força do impacto quase jogasse Miguel ao chão, mas ao invés disso o rapaz apenas bamboleou.
Por um segundo, os tauros simplesmente pararam, observando com estranhamento essa nova figura de um rapaz tão novo no meio de uma batalha, mas isso não os impediu de continuar. O tauro do machado se preparou para partir para cima de Miguel, mas antes que o alcançasse a figura rápida de Marlene, como um raio, decidiu interferir e se jogou sobre o ser, se apoiando de alguma forma sobre seu peito enquanto com uma das mãos golpeava com movimentos rápidos e incansáveis a cara do tauro, fazendo-o gritar e cair no chão.
O segundo tauro foi atrás de sua espada, que Bryan havia derrubado anteriormente, enquanto o terceiro descia sua espada na direção de Miguel, que agora, logo após ter realizado um ataque que salvara a vida de Bryan, parecia ter se dado conta da dimensão do perigo ao qual se encontrava, e por um segundo sua mente e seu corpo se paralisaram. Esse seria um tempo mais do que suficiente para ser cortado ao meio, mas Bryan, logo atrás dele, pulou sobre o rapaz de modo que caíssem para o lado e Miguel se salvasse sem aranhões. Bryan sofreu um leve corte de raspão na região da cintura.
Enquanto Miguel cuspia a grama que entrara em sua boca, o tauro já emendava um novo golpe horizontal sobre eles, e Bryan, sabendo que não conseguiria juntar forças para deter aquele golpe, simplesmente realizou um ataque com sua espada de baixo para cima, fazendo espada de seu inimigo passar por cima deles.
Aproveitando o momento, Marlene, que acabara de dar um jeito no outro tauro, pulava sobre este, realizando a mesma tática que funcionara com o outro.
Agora que Marlene lutava com o inimigo que enfrentavam, Miguel e Bryan conseguiram prestar atenção no outro tauro. O que havia ficado para trás para pegar sua arma do chão. Este agora corria na direção de Bryan com a espada erguida, mas antes que se aproximasse muito algo voou até eu pescoço e o fez cambalear e cair no chão, no meio da corrida. Sua cabeça por pouco não caiu sobre os pés de Bryan.
Miguel olhou para trás e viu que James já não parecia mais tão perdido quanto há alguns segundos atrás. Tinha sua besta em mãos e acabara de salvar a pele deles, assim como Marlene também fizera.
Assim que os tauros foram eliminados, todos se reuniram. Miguel ficou impressionado com a habilidade de Marlene e, somente agora, quando voltou a olhar para os punhos dela, lembrou qual era sua e porque ela atacara os tauros daquele jeito. Ao invés de usar espadas, lanças, machados ou qualquer coisa assim, a arma de Marlene era na verdade duas espécies de garras, das quais saíam três laminas do aparelho em seu pulso, e ela poderia controlar se saíram as três laminas ao mesmo tempo ou só uma a sua escolha. Era uma arma nada convencional, ainda assim a mulher era imbatível com aquelas garras.
Todos se olharam com o intuito de correr mata a dentro em direção ao navio, mas antes que o fizessem perceberam uma grande movimentação na direção contrária. Dezenas de tauros, liderados por um deles a frente da multidão, se destacando pela sua maior estatura e uma armadura com detalhes da cor roxa. Mesmo que portassem armas de curta distância e estivessem a poucos metros, contornando a lagoa, os tauros apenas caminhavam lentamente em direção a eles, o que chamou a atenção do grupo. Ao invés de fugirem, permaneceram encarando-os, tentando entender o que se passava ali.
- Já estão de partida?! Mas acabaram de chegar! – Gritava o tauro que liderava o bando. Sua voz era grossa e tinha um aspecto gutural, e ele tinha algo em sua boca de touro que deveria ser um sorriso.
- Este é Zack, o líder dos tauros. Suas palavras são como veneno, e nossa única chance de sobreviver é ignorando-as. Temos que ir agora! – Disse Marlene ao grupo. Sua voz soou firme, passando segurança aos demais.
Todos estavam visivelmente abalados com tudo que havia acontecido, além de um pouco desgastados pela última luta, ainda assim permaneceram firmes e correram calmamente pela clareira em direção ao navio deles – com a exceção de Miguel, que parecia mais trêmulo que os outros.
- Como é?!  Nenhum de vocês, covardes, pretendem vingar seu líder?! – Dizia Zack, ainda sem pressa. – Estão com tanto medo que eu os matem também?!
James diminuiu o passo em sua corrida. As mãos apertavam a besta com força. Bryan percebeu isso e puxou o irmão.
- James, vamos! Temos que ir!
- Será que ele era um líder tão ruim que não vale a pena ser vingado?! – Continuou Zack. – Pois tenho uma notícia pra vocês, são todos um lixo igual a ele!
James pareceu lutar contra a vontade ignorar tudo que ouvia e seguir em frente, mas seu rosto se tornou vermelho e ele parou no meio do caminho com um berro. E então se virou para Zack.
- NÃO OUSE FALAR DE ABNER! NÃO SABE NADA SOBRE ELE!
Sacou uma das flechas, carregou-a em sua besta e atirou na direção do peito de Zack, mas este teve tempo de puxar um dos tauros que caminhavam ao seu lado e o colocar a sua frente, usando seu corpo como escudo. A flecha atravessou a armadura do tauro e se fincou em seu peito.
O ser gritou, mas Zack continuou segurando-o, e ele já parecia ter forças para reagir. Os tauros continuaram avançando em direção aos humanos em passos curtos, enquanto James, tomado pela fúria, avançava em direção a eles com os amigos em seu encalço, gritando seu nome e pedido que parasse.
O homem não os deu ouvidos, e enquanto avançava sacou, armou e atirou uma nova flecha.
Um.
Dois.
Três.
Três flechadas atingiram o peito do ser que Zack usava como escudo, que a essa altura já nem se mexia mais. Enquanto sacava uma nova flecha e já estava a poucos metros de Zack, James percebeu que o outro largou seu escudo humano com indiferença, e por algum motivo ao invés de ir até ele foi em direção a um canto na lateral, onde se iniciava a floresta.
Imaginando que essa poderia ser sua chance, James já engatava outra flecha em sua besta quando entendeu o que Zack pretendia. O tauro foi até o corpo de Abner, encostado contra uma das arvores do lugar, e ergueu o corpo do homem a sua frente, como se agora pretendesse usá-lo como escudo ao invés do corpo do outro tauro.
Aquilo fez uma lágrima escorrer do rosto de James que, ao invés de engatar a flecha em sua besta, simplesmente jogou a besta – que continuava presa em sua bandoleira – para as costas e permaneceu com uma das flechas em mãos, correndo mais rápido que nunca em direção a Zack.
Zack faz um sinal para que os outros tauros apenas observassem, e quando James finalmente chegou até ele pulou em sua direção tentando enfiar sua flecha no pescoço do ser, mas antes que completasse o movimento Zack jogou o corpo de Abner com força sobre ele, fazendo-o fez cair no chão e seu nariz começar a sangrar.
Os tauros ali presentes riram.
Logo atrás de James, seus amigos e irmão também corriam em direção a Zack, que nem sequer havia desembainhado sua espada. O primeiro a chegar até ele foi Bryan, que tentou acertá-lo com um ataque de espada, mas o tauro o acertou um soco que o fez voar. Logo em seguida, com uma destreza incrível, Marlene saltava com suas garras em direção ao ser, que de alguma forma conseguiu erguer sua pata até a altura do peito da mulher e fazê-la cair no chão também.
Por último, um trêmulo Miguel atacou com sua espada na direção do rosto do ser. Seu movimento havia sido tão rápido que Zack ainda não havia conseguido se recuperar do último golpe que desferira contra Marlene, e quando se deu conta da presença de Miguel ele já estava mais próximo do que havia imaginado. Tentou recuar a cabeça se inclinando para trás, mas ainda assim a lâmina do garoto deslizou logo abaixo de seu olho, fazendo com que instantaneamente gotas de sangue voassem a sua frente.
O ser grunhiu e levou as mãos ao rosto enquanto todos os tauros que estavam ao redor, até então rindo, ficassem boquiabertos ao ver que um garoto tão jovem e assustado havia conseguido acertar e fazer sangrar seu líder.
Assim que o ser baixou as mãos da face Miguel pôde ver através dos olhos avermelhados de Zack que ele não grunhia pela dor, mas sim pela irritação e vergonha que sentira. Logo, o próprio fato de tê-lo acertado e gerado tal reação no outro pareceu mais assustador a Miguel do que se ele tivesse errado o golpe, e por um segundo nem percebeu os punhos de Zack se juntando em um movimento único e voando em direção a sua cabeça, acertando-o de cima para baixo e jogando-a ao chão no mesmo instante.
O corpo de Miguel, caído a frente de Zack, nem sequer se mexeu após o último golpe.
Enquanto tudo aquilo acontecia James, mesmo levando uma forte pancada no rosto e sem tirar por um segundo sequer os olhos de Zack, decidiu arrastar o corpo de Abner em direção a mata, onde ele não poderia ser usado novamente como arma ou sofresse algum maltrato dos outros tauros. Por mais que soubesse que aquilo era uma besteira, já que o homem já estava morto, sabia também que não suportaria ver seu corpo sofrer. Ainda se permitiu dar um um beijo de despedida na testa de seu amado antes de voltar até os outros.
Alguns segundos tensos se passaram enquanto James voltava e os outros se colocavam de pé, tentando ignorar os próprios ferimentos. Zack voltou a levar as mãos ao corte do rosto. O sangue inundou suas enormes mãos, e a ira tomou conta de seu corpo.
Ao erguer os olhos para os outros Zack percebeu uma figura pequenina correndo em direção a ele. Era uma criança, que quando passara ao lado de Marlene a mulher até tentou agarrá-lo no meio da corrida, mas foi em vão. Ao desviar dela, o garotinho chegou até o corpo do rapaz caído aos pés de Zack.
- Irmão, irmão! Se levante irmão! – Disse Isaque, com os olhos molhados mirando o corpo imóvel de Miguel. Todos observavam a cena atônitos, até que Isaque ergueu a cabeça em direção a Zack, e com os olhos vermelhos de ódio continuou – VOCÊ! VOCÊ FEZ ISSO COM ELE! SEU MOSNTRO! SEU...
Antes que pudesse continuar, Zack agarrou seu pequeno corpo com nojo e ergueu-o como se ele não tivesse peso algum, até que ficasse diante de seus olhos. No mesmo instante James apontou sua besta em direção a Zack. Bryan e Marlene se colocaram em postura de combate.
- LARGUE O GAROTO, ZACK! – Gritou James.
- Ou o que? Vai atirar em mim? Mesmo sabendo que posso usá-lo como escudo, como tentei fazer agora pouco com o cadáver de seu amado líder? – Dizia o tauro, gerando risadas entre seus semelhantes. Agora um sorriso malicioso surgia em sua face.
James apertava a besta com força, e sua face se tornou mais vermelha que nunca. Em um instinto, tentou mirar na direção da perna do ser, mas quase na mesma velocidade ele acompanhou seu movimento com o corpo do garoto, que gritava, em direção a aquela região.
- Por que não atira? É a melhor chance que terá lutando contra mim.
- SOLTE-O!
- Você manda!
Zack avançou em direção a James e acertou-o um chute no peito que o fez rolar pelo chão. Em seguida jogou Isaque para o alto, em direção ao grupo de tauros. Mãos se esticaram no intuito de pegá-lo, todos rindo e tratando a vida do pequeno garoto como um jogo. No meio da multidão alguém o pegou, e começaram a zombá-lo e cutucar seu corpo como se ele fosse um ser estranho, enquanto o menino chorava.
Zack deu uma gostosa risada, e então finalmente embainhou sua espada, andando na direção de James, ainda caído. Bryan trocou um olhar com Marlene e apontou discretamente para Miguel. Marlene inicialmente hesitou, mas depois assentiu.
Enquanto Bryan corria a frente do corpo do irmão e esperava a chegada de Zack, Marlene correu em direção ao corpo de Miguel e arrastou-o o mais longe que pôde. Os tauros se concentravam mais na batalha do que na mulher, ainda assim, quando a viram arrastar o corpo do garoto em direção a floresta, hesitaram, mas preferiram seguir as ordens que seu líder dera anteriormente e não interferir.
Marlene arrastava o corpo do garoto o mais rápido que podia. Felizmente ele não era tão pesado quanto imaginava, mas ainda assim não conseguia ser tão rápida quanto gostaria. Sabia que levaria algum tempo até que chegassem próximos ao navio, onde sua tripulação deveria estar reunida.
Não conseguia pensar em nada. Sua maior preocupação era se conseguiria voltar com reforços a tempo de salvar Isaque e ajudar James e Bryan, que já estavam lado a lado, lutando contra Zack enquanto os outros assistiam e riam cada vez que Zack fazia um bom movimento.
De repente pensou que, por melhores guerreiros que os irmãos fossem, talvez eles nem sequer conseguissem deter Zack a tempo suficiente dela chegar até o resto de seu grupo. Talvez aquele fosse o fim para eles. Todos eles.
Aquele pensamento quase a fez chorar, mas Marlene seguiu em frente carregando o corpo de Miguel.


FIM DA SEGUNDA PARTE

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

Conto: Novo Começo (1/3)

* Sinopse do livro aqui!

5 anos antes do início do caos.



Diário de bordo. James Williams, 27 anos, 13 de fevereiro.

Bryan está muito mais animado que eu em relação as nossas perspectivas de sucesso deste plano. Particularmente, me dói o pensamento de deixar tudo para trás e começar uma vida nova, mas acho que é algo que – se este lugar valer a pena – precisaremos fazer. Além do mais...

- James! Larga essa porcaria e vem ver isso! – Chamava a voz de Bryan no lado de fora do quarto da tripulação.
James fechou seu caderno e deixou-o sobre sua rede de dormir. Ajeitou sua besta – presa em suas costas através de uma bandoleira – e foi atrás do irmão. O convés estava cheio. Todos os tripulantes olhavam para fora navio.
- Achamos esta maldita ilha, James! – Dizia Bryan com um sorriso confiante assim que o irmão se aproximava do parapeito do convés. – Levamos o que? Alguns dias?
James avistou o motivo de toda aquela alegria. Um semblante de ilha que começava a se formar no horizonte.
- Como podemos saber que esse é o lugar? E se for a ilha Narabis, ou... alguma outra ilha pior.
- Você parece uma criança falando essas besteiras, James. Abner conhece Narabis. Ele já esteve lá. Se ele está dizendo que não é, é porque não é.
- Ele não está dizendo nada – Disse ele, observando Abner no convés superior. Com sua luneta, o líder também tinha seu olhar focado no horizonte.
Abner já havia passado de seu auge da forma física, agora estava com mais de 40 anos. Sua espada, presa a cintura, era de uma lâmina mais longa do que a maioria dos guerreiros da Organização estavam acostumados. Tinha os cabelos cumpridos, que um dia foram castanho-escuro e agora davam lugar aos fios grisalhos, presos sob um rabo de cavalo. Diferente de seu largo sorriso habitual, naquele momento sua expressão era séria, talvez até um pouco preocupado, já a postura era rígida, como a de um general de guerra.
- Nunca diz nada quando está apreensivo... – Continuou James.
- Com tudo que passamos em outras ilhas, todos estão apreensivos. E com razão, mas isso é besteira. Quando eu e meus companheiros viemos aqui, naquela missão de excursão, encontramos tudo completamente deserto. Acredite em mim, estou dizendo que a ilha é segura.
James mirou Bryan. Seu irmão era 5 anos mais novo que ele. Portava uma espada na bainha da cintura, tinha os cabelos curtos e bagunçados e a barba malfeita. Em geral era uma companhia animada, mas James sempre dizia que era o tipo de pessoa que ninguém gostava de manter por perto quando se estava aborrecido.
Bryan fitava a ilha como se mirasse sua primeira paixão, o que fez James franzir o cenho. Seu irmão estava seguro demais de suas palavras, e isso era o que mais o preocupava. E o pior de tudo era que já era tarde demais para qualquer conselho ou sermão. Bryan estava tão empolgado que já não lhe daria mais ouvidos.
- É. Eu espero... – Disse James.
- Ora, tire essa expressão carrancuda da cara, irmão! Desse jeito vai acabar convencendo nossos companheiros que estamos indo para um funeral.
- Não estou querendo convencer ninguém de nada, apenas fico pensando na possibilidade de encontrarmos os tauros ou algum ser pior por aí. Isto é, caso eles sejam realmente tão asquerosos quanto nos dizem, mas como podemos saber?
- Você acabou de responder isso. São asquerosos porque nossos companheiros que os conheceram comprovaram isso. Inclusive o próprio Abner. Porque passam tanto tempo juntos se ele não te conta essas histórias?!
As bochechas de James coraram, e ele desviou o olhar.
- Nu-nunca disse que ele não c-conta, só digo que acho isso estranho. Ora, pense bem Bryan, que motivo os tauros teriam para sair por aí colonizando ilhas e matando os humanos que encontram? Não há sentido algum nisso...
Bryan bufou.
- Há sentido se você pensar que os desejos deles são simples, James. São seres estupidos guiados pela ganancia. Querem demonstrar seu poder dominando outros lugares e povos, tomando seus bens, fazendo-os de escravos e sabe-se-lá se eles não se alimentam de nossos corpos? Já deve ter ouvido as histórias de Abner, são seres animalescos!
- Eu sei, eu sei, mas... será que não há algo mais? Quero dizer, nunca os vimos de verdade, sequer conhecemos a cor de seus olhos, como podemos ter tanta certeza de que essas são mesmo suas motivações?
- E o que mais poderia ser, James? Não há nada no mundo além da ganancia. Além disso, quando alguém te aponta uma espada ao pescoço o que você faz? Pergunta quais são seus objetivos e sonhos ou protege sua vida? A resposta é simples.
- É, talvez seja, mas a verdade é que um tauro nunca me apontou uma espada.
- Mas você nunca viu um tauro, e espero que nunca veja. Aliás, espero que nem um de nós veja. Ao invés devanearmos sobre essas bobagens deveríamos nos preocupar com o que temos que fazer.
James suspirou olhando o horizonte. O semblante da ilha se tornava cada vez maior.
- É, seja como for, com isso eu concordo.
Enquanto a tripulação preparava os botes para zarparem até a ilha, Marlene passava atrás deles como uma mãe zangada, dando uma bronca contida, para não chamar muita atenção, em Miguel e Isaque.
- Quanta irresponsabilidade, Miguel! Trazer um garotinho desta idade para uma missão com potencial para ser tão perigosa?!
- A missão não é perigosa! Você ouviu o que a tripulação da missão de excursão disse. A ilha está deserta!
- Não interessa! Tudo é perigoso para uma criança de 5 anos! – Insistia na bronca a mulher, enquanto adentravam no quarto da tripulação.
Curioso, James continuou observando-os enquanto entravam. Apoiado no parapeito do convés se encontrava em uma posição que favorecia a visão do trio dentro do quarto.
Miguel bufou.
- Enquanto estiver comigo, Isaque vai estar seguro! Além disso, ele quer conhecer outros lugares. Nós queremos!
- Simmm! Por favor, nos deixe ir também! – Interveio Isaque. – Sou muito forte! Posso me cuidar!
- Já chega – Disse a mulher. – Você não vai mais zarpar até a ilha. Vai ficar aqui cuidando de Isaque e guardando o navio.
- Mas Marlene, eu... – Tentou argumentar Miguel, sem sucesso.
- Sem “mas”, Miguel! Se não quer que eu conte isto a Abner é melhor me obedecer.
- Você vai contar de qualquer jeito...
- Mas ainda posso escolher as palavras que vou usar.
Os irmãos incorporaram expressões de arrependimento enquanto Marlene saía do quarto e subia até o convés superior, onde passava a conversar com Abner.
A mulher era sobrinha de Abner, líder da Organização que participavam, enquanto Miguel era um adolescente órfão que o grupo deles – essencialmente Abner – havia adotado quando ainda era criança, assim como Isaque, o irmãozinho caçula do rapaz.
- Não sei como Abner pode ter tanta paciência com esse Miguel... – Dizia Bryan que, sem que James percebesse, também estivera olhando aquela cena toda. – Está sempre achando motivos para fazer alguma merda.
Bryan voltou a fitar a ilha, enquanto James ainda mirava Miguel. O garoto deveria ter cerca de 15 anos de idade e, agora deitado, dividia uma rede com seu irmãozinho. Talvez estivesse arrependido de ter trazia seu irmão para algo tão perigoso como aquilo, ou talvez estivesse apenas aborrecido.
James alternou seu olhar para Abner, enquanto ele terminava de conversar com Marlene. O líder da Organização dirigiu um olhar a James, seguido de um aceno positivo de cabeça.
Naquele momento, aquele tão simples gesto fez James voltar a sentir o peso que carregava nas costas por ser um dos candidatos a substituir Abner na liderança da Organização, quando o momento chegasse. E o fato de ser o favorito por parte do próprio líder não amenizava esse peso.

*

Conforme levavam os botes até a areia da praia, transportando poucas dezenas de homens, James apreciava a paisagem do lugar. Com uma margem estreita entre o mar e a floresta, a areia durava pouco e a floresta parecia densa, dando um indicio de desabitação.
- É lindo, não é? – Disse Bryan, com aquele sorriso largo.
- É – Respondia James, tentando entender onde havia beleza em um gramado alto e milhares de plantas e árvores.
Quando os botes já estavam atracados, Abner ordenou que seguissem juntos mata a dentro. Andavam em fila indiana, de dois em dois. James havia ficado no meio da fila, enquanto Abner, Bryan e alguns outros que haviam participado da última excursão até aquela ilha permaneciam na linha de frente, abrindo caminho e tentando guiá-los.
A maioria se mostrava maravilhada com o lugar conforme o conheciam cada vez mais. Respaldavam toda a “beleza natural” do ambiente, e toda sua pureza, já que não havia sido destruída ou sequer tocada por seres vivos. Mas James achava aquele pensamento irônico, já que todos aqueles homens queriam fazer daquele lugar um lar, e para isso seria necessário subjulgar a ilha. As mãos humanas transformariam tal “pureza” em madeiras e concretos, e então o lugar ainda seria considerado tão belo ou isso não importaria mais?
Após algum tempo de caminhada com uma mistura de apreensão e animação, eles haviam chegado em uma clareira espaçosa onde, no final da mesma, havia uma pequena montanha formando uma cachoeira que dava vida a um pequeno lago. Todos sorriram ao verem que finalmente poderiam sair daquela densa floresta e correrem até a beirada do lago para beber água.
Por alguns minutos mataram a sede, encheram seus cantis e se refrescaram, mas logo Abner já reorganizava todos em suas posições. Tinham que vasculhar o máximo possível daquela ilha antes que anoitecesse e precisem voltar ao navio. Se tudo corresse como planejado, em poucos dias eles poderiam estar voltando para casa com a notícia de que havia um lugar seguro para o qual poderiam migrar.
Enquanto alguns homens terminavam de estacar bandeiras no solo com o símbolo da Organização, demarcando as áreas que já haviam sido exploradas pelo grupo, Abner terminava de organizar todos em fila, de volta mata adentro. Contornariam a cachoeira.
James terminava de encher seu cantil e se encaminhava para o final da fila, junto com os outros, até que Abner, que ainda não havia entrado na mata, fez sinal para que todos seguissem adiante enquanto segurava James pelo braço.
Aos poucos todos foram seguindo caminho em passos lentos, e assim que Abner e James estiveram sozinhos o líder desfez sua postura séria e expressou um olhar caloroso.
- Por que está tão sério hoje, James?
- Acho que pelo mesmo motivo que você.
Abner riu.
- Não me parece que esteja apreensivo com que vamos encontrar aqui. Por tudo que vimos até agora este lugar parece seguro. Você está diferente. Está melancólico...
James soltou um sorriso na ponta dos lábios.
- Você me conhece.
- Convivo com você a tempo o suficiente para isso.
- É, eu acho que sim. Apenas me pergunto se vale mesmo a pena deixar tudo que temos para trás e... começar do zero.
- Exato. Começar do zero – Dizia Abner, dando tapinhas no rosto do outro. Em seguida apontou para a cachoeira. – Caso este lugar ofereça bons recursos poderemos criar nosso povo aqui, longe da ignorância humana de Giordana. Seremos melhores. Viveremos em nossa própria busca pela paz.
James respirou fundo e permaneceu mudo por alguns segundos, mirando tudo ao seu redor. A floresta, a cachoeira, os pássaros cantando... e por um momento tudo aquilo já não lhe parecia mais tão louco.
- É, talvez você tenha razão. Você sempre tem.
Abner expressou um sorriso mais largo e deu novos tapinhas na face de James.
 - Bom saber que, mesmo velho, ainda consigo te fazer mudar de ideia.
James iria interromper o outro para dizer alguma coisa, mas Abner desviou o olhar para longe e deu um suspiro cansado, e então pareceu como se, ao invés de pouco mais de 40 anos, ele tivesse o dobro disso em idade e o triplo em sabedoria.
- Quando eu morrer, sabe que vou querer que você cuide do nosso legado, não é? – Continuou Abner, voltando a contemplar James. Mantinha a expressão cansada e um quê de derrotada na face.
- Não fale como se já fosse um idoso a beira da morte.
- Tenho mais de 40 anos, James. Quantas pessoas com 60 você conhece?
- Gregório Silver está quase lá...
- Gregório é um homem honrado e muito mais forte do que eu jamais serei. Forte o bastante para enganar a morte algumas vezes. Mas diferente dele, eu sinto que minha hora logo vai chegar.
- Não diga...
- Não, James. Ela vai. Cedo ou tarde ela chega para todos. E em meu caso o “tarde” está logo aí.
- Você sabe que temos as poções dos hannomans, não sabe? Temos aliados fortes e nenhuma guerra para lutar há muito tempo. Todos podemos superar as expectativas de vida atual.
- Talvez sim, talvez não, a única coisa que é certa é que morreremos algum dia. E é por isso que preciso que você esteja preparado quando o momento chegar.
- Só me quer o substituindo porque gosta de mim. Todos conseguem ver que não sou a pessoa certa para a liderança. Marlene é muito mais capaz que eu. É firme e fria. Sempre pensa nos outros, e por isso tem o respeito de todos. Deveria ter visto como ela tratou Miguel e Isaque, no navio. Era líder e mãe ao mesmo tempo. Além disso, Marlene é sua sobrinha.
Abner hesitou por um momento, mas seu sorriso não tardou a voltar.
- Receio que possa ter uma tendência excessiva ao remorso, às vezes... – Dizia ele, em tom melancólico. – Tanto dentro da Organização quanto fora dela eu sempre prezei pela segurança de todos. Não da maioria, mas sim de todos. Você entende isso, não é?
- Acho que sim.
James não entendia. Em momentos de risco, muitas vezes a “segurança de todos” não era uma opção, logo, deveria se optar pela “segurança da maioria”. De qualquer maneira, não questionou. Preferia não estender aquele assunto.
- Mesmo assim, conheço as várias qualidades de Marlene mais do que qualquer um, e continuo preferindo você. Queria este serviço antes, James. Está inseguro?
- Eu... não. Não é isso... – Disse James, deixando seu olhar descer aos próprios pés. – De repente me ocorreu que eu posso simplesmente não ser a melhor pessoa. O mais merecedor, ou... eu sei lá.
- James – Chamou-o Abner, se aproximando do outro e pondo uma das mãos em seu ombro. O corpo transmitindo seu calor. – Por que não está sendo verdadeiro comigo? Sabe que pode falar o que quiser para mim, não é?
James suspirou.
- Eu nunca quis ser líder. Eu só queria estar ao seu lado, te ajudando, te apoiando... Quando você falou que me queria para substituí-lo, eu nem achei que fosse sério no início, mas depois eu quis isso... por um tempo. Queria ser como você, forte e admirado. Mas descobri que não tenho vocação ou vontade para este trabalho. Não quero ser responsável pelo futuro de todos.
Abner aproximou seu corpo delicadamente contra o de James. Em um movimento lento seu lábio roçou levemente no do outro, fazendo-o tremer, e então o beijou.
- Não precisa mentir para mim – Disse Abner, ao fim do beijo.
James não conseguiu conter um sorriso que mostrava seus dentes.
- Eu sei. Às vezes eu só esqueço o quanto você é maravilhoso.
Eles permaneceram em um abraço desajeitado – já que a besta de James ficava presa em suas costas, atrapalhando um pouco o gesto – por alguns segundos. A vontade de ficar perto um do outro fazia-os sentir como se houvessem ficado longe há anos, quando na verdade faziam apenas duas noites.
O barulho de grama se mexendo e vozes sussurradas foi quase insignificante, mas não imperceptível para bons ouvidos como os de Abner. O homem, em um dos raros momentos de descanso que tinha, recolheu seu queixo do ombro de James e se afastou alguns passos dele, olhando ao redor como se procurasse algo.
James, que não havia escutado nada, percebeu que a reação do outro indicava que algo estava errado, o que o levou a olhar ao redor também. Pássaros voavam, e talvez alguma cobra rastejasse em algum lugar, mas James não viu nenhuma ameaça por perto.
Abner riu de modo extravagante.
- Deve ser só o vento! – Disse ele aumentando a voz ligeiramente, por algum motivo. Em seguida voltou a falar, dessa vez sussurrando. – É Miguel. Não deve ter aguentado ficar no navio e por isso veio para cá. Isaque deve estar com ele.
- O que?! Quanta irresponsabilidade! – Reclamou James. – Mande-o de volta ao navio!
- Vou mandar alguém levá-lo de volta – Sussurrou ele, em meio a uma nova risada. – Então não fale tão alto, vai fazer ele perceber que notamos ele.
James bufou.
- Você o mima demais.
- E você provavelmente está certo. Ele é praticamente um filho para mim, mas eu não sou um pai muito presente. Acho que tento recompensá-lo da forma errada.
- Você deveria... – Começou a dizer James, até ser interrompido por barulhos distantes de gritos e correria.
Abner e James se afastaram, olhando ao redor com olhos arregalados. James se encontrava assustado, já o líder, dotado de sagacidade, engoliu em seco e tentou demonstrar confiança.
- James, vá atrás de Miguel e Isaque e os leve de volta ao navio. Eu vou verificar o que...
“Pleft!”.
Antes que pudesse terminar sua frase algo passou voando perto do cotovelo de James. Olhou naquela direção e, para sua surpresa, viu uma lança fincada no chão, ao seu lado. Voltou-se na direção de quem havia arremessado tal objeto, no topo do morro onde a cachoeira percorria. Cerca de uma dezena de seres que, mesmo andando em duas patas, assemelhavam-se muito a touros com braços e mãos ao invés de patas dianteiras. Vestiam armaduras de guerra e estavam armados com lanças.
- Tauros... – Murmurou James para si mesmo, com os olhos vidrados de medo.
Aqueles seres dos quais ele tanto ouviu falar sempre que se mencionava “passado” e “guerra” estavam ali logo a sua frente. Logo naquela ilha aparentemente inabitada e segura.
Assustado, tornou a olhar em direção a Abner, que tinha o corpo trêmulo, os olhos repletos de dor e a boca aberta, como se sua alma fugisse lentamente de seu corpo. James já havia visto esse tipo de reação em uma pessoa antes, e ele sabia que só poderia significar uma coisa.
Uma enorme lança atingira o líder nas costas, atravessando bem no meio de seu peito e terminando fincada no solo.
Abner sequer gemeu, apenas fitava James enquanto lutava contra a vontade que sentia de fechar os olhos e cair no chão. O outro estava paralisado. Atônito, não sabia como reagir, até que, em um impulso, foi em direção ao líder quando percebeu que ele desmaiaria sobre aquela lança, o que agravaria ainda mais sua situação.
Passou o braço dele sobre seu ombro e o carregou, da forma que pôde, até atrás de uma árvore perto dali, escondendo-se do campo de visão dos tauros, que já gritavam “atacar!” e faziam novas lanças voltarem a chover no local.
Jogados ao chão, atrás da árvore, James percebeu que outra lança havia acertado Abner de raspão, dessa vez em sua perna. Praguejando, quebrou ao meio a lança fincada no peito do homem, fazendo com que ele finalmente soltasse alguns gemidos de dor. Lágrimas escorreram pelo rosto de James e encontraram a testa de Abner, que o fitava com o os olhos trêmulos que aos poucos, como uma vela que se apaga, ficaram completamente imóveis e sem fogo.
Toda a gritaria e correria que ouviram anteriormente estava ainda maior agora. De forma desordenada, diversas pessoas da Organização corriam em direção a James e passavam direto por ele, se mostrando ainda mais assustados com o fato de ver Abner naquele estado.
Ignorando a todos, James abraçava o corpo de Abner, aos prantos, até uma Marlene trêmula se ajoelhar a sua frente, checar os batimentos cardíacos de seu tio e mirar James, pálida.
Marlene constatou o que James já sabia desde o primeiro instante, e eles nem precisaram trocar quaisquer palavras para se chegar a um entendimento sobre aquilo.
- Temos que ir, James. Agora! – Disse Marlene, com a voz frouxa.
O homem sacudiu a cabeça para os lados e, com a mão trêmula, fechou os olhos de Abner, decidido a ficar o maior tempo possível ao lado de seu amado.
- Vá sem. Não posso deixá-lo.



FIM DA PRIMEIRA PARTE